Se existe uma realidade que a pandemia do novo coronavírus deixou ainda mais latente no Brasil foi a abissal desigualdade social entre a classe média e os mais pobres, entre brancos e negros, entre o asfalto e a favela. Neste momento, autoridades públicas, a comunidade científica e parte da imprensa passam a se preocupar com algo que por décadas foi ignorado: casas de dois cômodos com cinco ou mais pessoas e a total ausência de saneamento básico nas periferias. Essa nossa mazela social, agora mais exposta, é algo que nunca passou despercebido pelas lentes do fotógrafo Bruno Itan. Cria do Complexo do Alemão – na Zona Norte do Rio de Janeiro – e especializado em fotografia de favela, ele tem percorrido vielas e becos, conversado com moradores e registrado de forma singular o dia a dia das comunidades cariocas diante da maior crise de saúde pública dos últimos tempos.
Fotografar e publicar a vida na favela é algo que Bruno Itan faz há 12 anos, alertando e divulgando a sua arte. Mas em tempos de Covid-19, esse trabalho ganhou novo significado.
“Eu quero fazer da imagem uma ponte pra mostrar aquilo que muitos, mesmo os moradores do Rio, fingem que não veem, mas que com o coronavírus ficou escancarado”, conta o fotógrafo que, além do Alemão, está percorrendo a Cidade de Deus e o Jacarezinho em busca de histórias.
O trabalho de Itan é jornalístico. Ele conversa com os moradores, ouve as histórias por trás do clique. Tomando os cuidados devidos de distanciamento e higiene, entra em algumas casas para entender a realidade das famílias.
“Algumas pessoas eu conheço; outras, não. Claro que não conheço todo mundo. Mas as pessoas percebem que eu não sou estranho, que sou morador, e assim vão se abrindo. Não sou invasivo, mas preciso ir além do clique”, explica.
O fotógrafo não sabe ao certo quantas casas percorreu desde o início da pandemia, mas tem em seus arquivos mais de 200 fotos exclusivas. Algumas delas estão no seu Instagram e Facebook. Bruno Itan é referência neste tipo de trabalho.
“Recebo diariamente muitos pedidos de jornais, revistas e agências de notícias pedindo minhas fotos. Há um certo preconceito da grande imprensa quando o assunto é favela. Eles não querem enviar seus fotógrafos e repórteres aqui para fazer o que eu faço, mas querem minhas fotos. Não tenho problema em ceder, mas o reconhecimento seria importante”, argumenta o fotógrafo, que já atuou em grandes jornais cariocas e no Governo do Estado.
Para Itan, 31, que é de Recife (PE), mas que há 20 anos vive no Complexo do Alemão, a favela percebe a ausência de projetos e de políticas públicas – e absorve a falta de alinhamento entre os governantes.
“Lógico que eles absorvem o que o presidente fala. Se ele diz que é uma gripezinha, a coisa afrouxa aqui também. Estou vendo trânsito de moto, de carro, comércio aberto… A verdade é que não tem poder público. Não existe nenhuma iniciativa forte, nem municipal, nem estadual, e tampouco do federal para as favelas”, questiona o fundador do projeto social Olhar Complexo, que ensina fotografia gratuitamente para os jovens e crianças do Alemão.
Bruno conta que os resultados do seu trabalho vão além das telas e da galeria das mídias sociais.
“Teve muitos casos que, a partir de uma foto que eu publiquei, as pessoas vieram me perguntar como podem fazer uma doação, como podem ajudar efetivamente. Isso é incrível. Estou usando a fotografia como uma ferramenta de solidariedade. É a ferramenta que eu tenho”, pontua o fotógrafo, que, atualmente, é voluntário em dois projetos sociais: Abraço campeão e Favela Arte.
Bruno Itan contou ao Notícia Preta que, para o futuro, pretende expor as fotografias que está fazendo.
“Além de uma mostra com fotos que revelam o dia a dia da favela e o coronavírus, devo lançar, em parceria com alguns amigos produtores e editores de vídeo, um documentário exclusivo”, adiantou.
Quem quiser acompanhar as fotos e as histórias por trás delas, deve seguir o fotógrafo nas mídias sociais, Instagram e Facebook: @brunoitan. Afinal de contas, ele é um de nós contando nossas histórias com o nosso olhar.
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